segunda-feira, 27 de maio de 2019

Configuração de Cabos em Moitões de Guindastes




Fui recentemente consultado por outro profissional da área quanto à metodologia no planejamento de Rigging para determinação do número de passadas de cabo na configuração de um guindaste para içamento de uma determinada carga. Porém a dúvida levantada foi decorrente da aplicação de uma metodologia que foge a prática usual, através de uma tabela adicional para indicar o número de passadas de cabo em função de perdas por atrito.
Inicialmente me surpreendi quanto a esse questionamento, uma vez que é usual fazer essa determinação em função da razão da carga bruta a ser içada pela carga média de trabalho do cabo de içamento para o moitão selecionado, o que também, observadas as limitações, é válido em grande parte das situações corriqueiras adotando a divisão pelo SWL do cabo.
Assim fui motivado a escrever esse artigo pela percepção de que há muitos profissionais da área que adotam essa metodologia direta sem se dar conta que na medida que são necessárias mais pernas de cabo há pequena e gradativa redução da capacidade total dessas pernas, o que consta de indicações específicas de cada equipamento em suas tabelas técnicas, e que podem também ser deduzidas em suas tabelas comerciais.
Essa pequena redução é fruto basicamente de três fatores, o atrito de rolamento nas polias, o esforço de deformação do cabo (atrito interno) e a inércia rotacional. De forma simplificada essa redução vai resultar num valor médio da carga efetiva para cada número de passada de cabos.
Porém percebo ainda haver certa confusão por parte de alguns profissionais em não fazer distinção entre o atrito de rolamento e o atrito de deslizamento, na realidade o que chamamos de atrito de rolamento é a resistência ao rolamento que é fruto da ampliação de um ponto ou linha de contato para uma pequena superfície, por conta da deformação decorrente da carga de contato, o que desloca a resultante de ração de forma a gerar um momento resistente. Contudo essa resistência e bem menor que o atrito de deslizamento, o que resulta em um pequeno momento resistente aplicado no rolamento de cada polia, assim a força resistente quando transferida para o cabo, no raio externo da polia é ainda menor.
Quanto à deformação do cabo temos uma influência também pouquíssimo relevante dado a relação adotada entre o diâmetro das polias e o diâmetro do cabo, o que faz parte do projeto do equipamento.
Devido ao regime de trabalho com velocidade e aceleração angular, baixas, assim como pela otimização da massa das polias, o efeito de resistência inercial a rotação também é pouquíssimo relevante e certamente é também objeto de estudo por parte dos fabricantes dos equipamentos.
Não há nenhum demérito para o profissional de planejamento de Rigging em desconhecer essas questões, afinal os “Riggers Projetistas” não têm em seu escopo profissional responsabilidade pelo projeto dos equipamentos que vão utilizar, e esses detalhes da engenharia de projeto e suas implicações operacionais estão inclusos tanto nas tabelas comerciais, como nas tabelas técnicas dos guindastes, o que pode ser observado fazendo-se a analogia entre a capacidade de cada um dos moitões previstos para o equipamento com o número máximo de passadas de cabo no mesmo.
Tomando como exemplo o Guindaste Liebherr LTM1400-7.1 temos as seguintes opções de moitões em sua tabela comercial:



Observem que no caso do gancho com cabo singelo, usualmente conhecido como bola peso, temos a capacidade de 12,5 t, porém dividindo a capacidade dos demais moitões pelo número máximo de passadas de cabo podemos estimar os valores limite para cada condição, e verificar que há gradativa redução:




Na tabela acima podemos observar que a redução da carga média na perna de cabo para o moitão com capacidade para 238,6 t é de 13,24 %.
Consultando uma das tabelas técnicas do guindaste Liebherr LTM 1400-7.1, obtemos como referência a capacidade de carga na faixa de 1 a 18 pernas de cabo:



Fazendo a análise dos valores indicados pelo fabricante, podemos avaliar de forma mais didática esse efeito calculando o valor médio de tração que é admitido em cada condição:


Observando a tabela acima constatamos que há sutil diferença com relação aos valores que foram estimados anteriormente com base nos dados dos moitões indicados na tabela comercial do equipamento, não deixando de haver coerência.

Considerando a estimativa inicial com base nos moitões que constam da tabela comercial, podemos fazer uma verificação pelo método corriqueiro de dividir a carga a ser içada pelo SWL do cabo e assim obter o número de passadas de cabo requerido, como segue:


No exemplo da tabela acima podemos observar que não houve divergência entre o calculo convencionalmente adotado, dividindo-se a carga pelo SWL, com os valores indicados na tabela técnica até 11 passadas de cabo. Os valores calculados não resultam em números inteiros e independente do valor decimal os resultados são arredondados para cima (arredondamento assimétrico), contudo podemos observar diferenças nos valores calculados indicados em vermelho, com relação aos valores tabelados destacados em negrito, por isso é fundamental que os profissionais de planejamento de Rigging tenham o conhecimento das informações que constam das tabelas técnicas dos equipamentos.
Essa inconsistência pode ser facilmente eliminada por consulta direta às tabelas de número de pernas de cabo que indicam a capacidade de carga, ou de forma bastante conservativa se adotada a metodologia de cálculo dividindo pelo valor médio de tração no cabo para cada moitão, sem haver necessidade de consultar nenhuma tabela adicional relacionada a Vantagem Mecânica ou Atrito.
Para melhor exemplificar o que foi exposto acima, tomando como base o moitão com capacidade para 129,2 t, temos esse valor dividido pelo SWL do cabo (12,5 t) igual a 10,34, o que nós leva ao resultado de 11 pernas de cabo e que corresponde ao número possível de passadas de cabo neste moitão e que coincide com a indicação na tabela técnica do equipamento. Porém na metodologia equivocada que me foi apresentada pelo profissional que levantou a dúvida, há uma tabela que para o resultado de 10,34 indica a necessidade de 18 pernas de cabo o que requer para o içamento de 129,2 t com o guindaste LTM 1400 7.1 que estamos tomando como exemplo, a utilização de um moitão com capacidade para 201 t e 7 pernas de cabo a mais do que o indicado pelo fabricante. Só o acréscimo do moitão para esse caso já representa 1t a mais de carga, sem considerar o peso do cabo também acrescido desnecessariamente, o que foge as boas práticas no sentido de estar agregando carga desnecessária na atividade.
É preocupante o fato de haver desinformação nesse sentido, que mesmo sendo conservativa induzindo a aumentar o número de passadas de cabo em relação ao que está definido pelas tabelas dos equipamentos, é prejudicial às boas práticas, posto que impõe restrições a atividade no sentido de agregar carga adicional, não só em função de acréscimo de pernas de cabo não necessárias, como na indicação em algumas situações de utilização de moitão maior e mais pesado que o necessário para operação, para possibilitar o excedente de pernas de cabo.
Uma outra situação que exemplifica a inconsistência de adotar fatores adicionais aos já considerados pelos fabricantes pode ser verificada também no caso do LTM 1400 7.1 para uma carga bruta de 35 t, mesmo o equipamento tendo um moitão de uma polia que possibilita três pernas de cabo com capacidade para 37,4 t, pelo conceito que me foi apresentado seria necessário utilizar 4 pernas de cabo o que conforme tabela técnica admite até 49,6 t, requerendo a utilização do moitão com capacidade para 84,7 t.
Não há nenhum impedimento em se fazer a utilização de maior capacidade que a necessária, porém não há respaldo técnico nem normativo em se estabelecer parâmetros adicionais aos já contemplados nas literaturas técnicas dos equipamentos que venham a impor limitações operacionais distintas das definições dos fabricantes dos equipamentos.
Muitas vezes numa atividade de montagem é preferível configurar o equipamento de forma que atenda a maioria das situações sem haver necessidade de trocas constantes de moitão ou alterações constantes no número de pernas de cabo, assim para as cargas menores essa configuração fica com razoável folga, porém, eventualmente temos a necessidade de reduzir pernas de cabo e utilizar um moitão menor que esteja adequado a uma carga menor que será movimentada num raio mais longo, o que em geral não nos deixa margens para ter acréscimos desnecessários de carga.
É sempre importante na utilização de um equipamento de movimentação de cargas que tomemos como base as indicações das tabelas de cargas do equipamento para as diversas possibilidades de configuração, atentando para as limitações, não só em relação à capacidade de carga, aos quadrantes de operação e velocidade de vento admissível, como em relação ao número de pernas de cabo requerido, não havendo dessa forma que se recorrer a nenhum artifício adicional, ou tabela adicional que não esteja incorporada na literatura técnica do equipamento fornecida pelo fabricante.  


Autor: Roberto de Souza van der Linden, Engenheiro Mecânico (UFPE), com curso de especialização em Engenharia Naval (UPE/USP) e  Rigger RGS/1459/2009 (OPUS/SOBRATEMA)

Linden Engenharia
robertolindenen@hotmail.com






















Movimentação de Cargas - Analisar sempre, planejar primeiro, improvisar jamais!



Içamento de estrutura suporte de tremonhas do precipitador eletrostático - Abril de 2013 (RNEST)
Em muitas situações para o içamento de uma carga pode ser necessário estudar um arranjo de lingadas mais elaborado, mas nesse ponto há de se ter a responsabilidade em saber exatamente o que está fazendo, uma vez que é fundamental ter certeza dos esforços atuantes em cada cinta ou cabo, em cada manilha, e também os esforços que a amarração adotada vai gerar na carga.
Acidentes ocorrem por diversas causas, mas a maioria delas está associada a falha humana. Negligenciar a análise da amarração de cargas é um ponto que pode causar acidentes, seja por falha de alguma lingada, seja por colapso estrutural da carga que está sendo içada.
Esse artigo visa enfatizar a importância do completo e prévio planejamento da atividade de movimentação de cargas. Não se pode negligenciar nenhuma etapa de planejamento, independente do peso da carga a ser içado.
O içamento de estruturas pré-montadas requer análises que transcendem o plano de Rigging, e para esses casos necessariamente devem ser feitas em complemento ao planejamento de Rigging, requerendo avaliação específica de engenharia.
No içamento de uma estrutura pré-montada, suporte de tremonhas de um Precipitador Eletrostático, pesando 13 t, as circunstâncias da obra nos deram o desafio de realiza-la com dois equipamentos que estavam disponíveis que eram 01 Guindaste Zoomlion QY-75 e um guindaste XCMG QY-130.
Detalhe da amarração da carga
Visando não agregar mais carga para cada um dos guindastes, também devido a limitações de altura, fizemos a opção de não usar Balancins, e realizar a amarração com treliças de cabos (Popularmente conhecido como “Pé de Galinha”). Essa é uma aplicação de mecânica vetorial, e por se tratar de triângulos quaisquer a solução matemática se dá facilmente por aplicação da Lei dos Senos, ou da Lei dos Cossenos.
De fato as cintas usadas, principalmente as inferiores externas (Laranjas) estavam superdimensionadas para a carga, o que se deu exclusivamente em função da disponibilidade de quantidade no comprimento necessário.
 Analise vetorial dos esforços nas lingadas
Para garantir o sucesso da operação a modelagem matemática da amarração da carga foi item primordial, algo que a primeira vista parece complexo, mas não é, requerendo para tanto conhecimento de matemática de segundo grau e entendimento de mecânica vetorial.
Devido a esbeltez e comprimento da carga com base nas reações obtidas nos doze suportes de içamento, que também foram item de estudo e dimensionamento, foi possível avaliar o comportamento da estrutura durante o içamento.
Com o conhecimento das forças em todas as lingadas foi possível determinar os esforços de compressão longitudinal e transversal na estrutura, e fazer análise de flexão com a determinação do diagrama de esforços cortantes e de momento fletor e avaliação dos esforços atuantes nas juntas soldadas, de forma a ter certeza que durante o içamento a estrutura não sofreria danos devido a amarração de carga e sobretudo ter a certeza de não haveria colapso estrutural o que poderia provocar um acidente de grandes proporções.
Análise de esforços na estrutura (Carga)
Assim a operação foi realizada com êxito, o Guindaste Zoomlion operou com F.U. de 77% e o XCMG com F.U de 71% o que garantiu total segurança quanto a estabilidade, respeitando a boa prática de aumentar a folga operacional em operações com dois guindastes.
Instrução pré-operacional - Equipes de movimentação de cargas e montagem
Na medida que as operações são realizadas com o correto planejamento e prevenção de todos os riscos, nos distanciamos do perigo de acidentes, e todos os envolvidos tem crescimento profissional com a experiência adquirida.


Roberto de Souza van der Linden

Engenheiro Mecânico – LINDEN ENGENHARIA
robertolindenen@hotmail.com
Artigo publicado no Linkedin em 17/05/2018: https://www.linkedin.com/pulse/movimentação-de-cargas-analisar-sempre-planejar-roberto/