Fui recentemente consultado por outro profissional da área quanto à
metodologia no planejamento de Rigging para determinação do número de passadas
de cabo na configuração de um guindaste para içamento de uma determinada carga. Porém a dúvida levantada foi decorrente da aplicação de uma metodologia que foge a prática usual, através de uma tabela adicional para indicar o número de passadas de cabo em função de perdas por atrito.
Inicialmente me surpreendi quanto a esse questionamento, uma vez que é
usual fazer essa determinação em função da razão da carga bruta a ser içada
pela carga média de trabalho do cabo de içamento para o moitão selecionado, o
que também, observadas as limitações, é válido em grande parte das situações
corriqueiras adotando a divisão pelo SWL do cabo.
Assim fui motivado a escrever esse artigo pela percepção de que há
muitos profissionais da área que adotam essa metodologia direta sem se dar
conta que na medida que são necessárias mais pernas de cabo há pequena e
gradativa redução da capacidade total dessas pernas, o que consta de indicações
específicas de cada equipamento em suas tabelas técnicas, e que podem também
ser deduzidas em suas tabelas comerciais.
Essa pequena redução é fruto basicamente de três fatores, o atrito de
rolamento nas polias, o esforço de deformação do cabo (atrito interno) e a
inércia rotacional. De forma simplificada essa redução vai resultar num valor
médio da carga efetiva para cada número de passada de cabos.
Porém percebo ainda haver certa confusão por parte de alguns profissionais
em não fazer distinção entre o atrito de rolamento e o atrito de deslizamento,
na realidade o que chamamos de atrito de rolamento é a resistência ao rolamento
que é fruto da ampliação de um ponto ou linha de contato para uma pequena
superfície, por conta da deformação decorrente da carga de contato, o que
desloca a resultante de ração de forma a gerar um momento resistente. Contudo
essa resistência e bem menor que o atrito de deslizamento, o que resulta em um
pequeno momento resistente aplicado no rolamento de cada polia, assim a força
resistente quando transferida para o cabo, no raio externo da polia é ainda
menor.
Quanto à deformação do cabo temos uma influência também pouquíssimo relevante
dado a relação adotada entre o diâmetro das polias e o diâmetro do cabo, o que
faz parte do projeto do equipamento.
Devido ao regime de trabalho com velocidade e aceleração angular,
baixas, assim como pela otimização da massa das polias, o efeito de resistência
inercial a rotação também é pouquíssimo relevante e certamente é também objeto
de estudo por parte dos fabricantes dos equipamentos.
Não há nenhum demérito para o profissional de planejamento de Rigging
em desconhecer essas questões, afinal os “Riggers Projetistas” não têm em seu escopo
profissional responsabilidade pelo projeto dos equipamentos que vão utilizar, e
esses detalhes da engenharia de projeto e suas implicações operacionais estão inclusos
tanto nas tabelas comerciais, como nas tabelas técnicas dos guindastes, o que pode
ser observado fazendo-se a analogia entre a capacidade de cada um dos moitões
previstos para o equipamento com o número máximo de passadas de cabo no mesmo.
Tomando como exemplo o Guindaste Liebherr LTM1400-7.1 temos as
seguintes opções de moitões em sua tabela comercial:
Observem que no caso do gancho com cabo singelo, usualmente conhecido
como bola peso, temos a capacidade de 12,5 t, porém dividindo a capacidade dos
demais moitões pelo número máximo de passadas de cabo podemos estimar os
valores limite para cada condição, e verificar que há gradativa redução:
Na tabela acima podemos observar que a redução da carga média na perna
de cabo para o moitão com capacidade para 238,6 t é de 13,24 %.
Consultando uma das tabelas técnicas do
guindaste Liebherr LTM 1400-7.1, obtemos como referência a capacidade de carga
na faixa de 1 a 18 pernas de cabo:
Fazendo a análise dos valores indicados pelo fabricante, podemos
avaliar de forma mais didática esse efeito calculando o valor médio de tração
que é admitido em cada condição:
Observando a tabela acima constatamos que há sutil diferença com
relação aos valores que foram estimados anteriormente com base nos dados dos
moitões indicados na tabela comercial do equipamento, não deixando de haver
coerência.
Considerando a estimativa inicial com base
nos moitões que constam da tabela comercial, podemos fazer uma verificação pelo
método corriqueiro de dividir a carga a ser içada pelo SWL do cabo e assim
obter o número de passadas de cabo requerido, como segue:
No exemplo da tabela acima podemos observar que não houve divergência
entre o calculo convencionalmente adotado, dividindo-se a carga pelo SWL, com
os valores indicados na tabela técnica até 11 passadas de cabo. Os valores
calculados não resultam em números inteiros e independente do valor decimal os
resultados são arredondados para cima (arredondamento assimétrico), contudo
podemos observar diferenças nos valores calculados indicados em vermelho, com
relação aos valores tabelados destacados em negrito, por isso é fundamental que
os profissionais de planejamento de Rigging tenham o conhecimento das
informações que constam das tabelas técnicas dos equipamentos.
Essa inconsistência pode ser facilmente eliminada por consulta direta
às tabelas de número de pernas de cabo que indicam a capacidade de carga, ou de
forma bastante conservativa se adotada a metodologia de cálculo dividindo pelo
valor médio de tração no cabo para cada moitão, sem haver necessidade de
consultar nenhuma tabela adicional relacionada a Vantagem Mecânica ou Atrito.
Para melhor exemplificar o que foi exposto acima, tomando como base o
moitão com capacidade para 129,2 t, temos esse valor dividido pelo SWL do cabo
(12,5 t) igual a 10,34, o que nós leva ao resultado de 11 pernas de cabo e que
corresponde ao número possível de passadas de cabo neste moitão e que coincide
com a indicação na tabela técnica do equipamento. Porém na metodologia equivocada
que me foi apresentada pelo profissional que levantou a dúvida, há uma tabela
que para o resultado de 10,34 indica a necessidade de 18 pernas de cabo o que
requer para o içamento de 129,2 t com o guindaste LTM 1400 7.1 que estamos
tomando como exemplo, a utilização de um moitão com capacidade para 201 t e 7
pernas de cabo a mais do que o indicado pelo fabricante. Só o acréscimo do
moitão para esse caso já representa 1t a mais de carga, sem considerar o peso
do cabo também acrescido desnecessariamente, o que foge as boas práticas no
sentido de estar agregando carga desnecessária na atividade.
É preocupante o fato de haver desinformação nesse sentido, que mesmo
sendo conservativa induzindo a aumentar o número de passadas de cabo em relação
ao que está definido pelas tabelas dos equipamentos, é prejudicial às boas
práticas, posto que impõe restrições a atividade no sentido de agregar carga
adicional, não só em função de acréscimo de pernas de cabo não necessárias,
como na indicação em algumas situações de utilização de moitão maior e mais
pesado que o necessário para operação, para possibilitar o excedente de pernas
de cabo.
Uma outra situação que exemplifica a inconsistência de adotar fatores
adicionais aos já considerados pelos fabricantes pode ser verificada também no
caso do LTM 1400 7.1 para uma carga bruta de 35 t, mesmo o equipamento tendo um
moitão de uma polia que possibilita três pernas de cabo com capacidade para
37,4 t, pelo conceito que me foi apresentado seria necessário utilizar 4 pernas
de cabo o que conforme tabela técnica admite até 49,6 t, requerendo a
utilização do moitão com capacidade para 84,7 t.
Não há nenhum impedimento em se fazer a utilização de maior capacidade
que a necessária, porém não há respaldo técnico nem normativo em se estabelecer
parâmetros adicionais aos já contemplados nas literaturas técnicas dos equipamentos que venham a
impor limitações operacionais distintas das definições dos fabricantes dos
equipamentos.
Muitas vezes numa atividade de montagem é preferível configurar o
equipamento de forma que atenda a maioria das situações sem haver necessidade
de trocas constantes de moitão ou alterações constantes no número de pernas de
cabo, assim para as cargas menores essa configuração fica com razoável folga,
porém, eventualmente temos a necessidade de reduzir pernas de cabo e utilizar
um moitão menor que esteja adequado a uma carga menor que será movimentada num
raio mais longo, o que em geral não nos deixa margens para ter acréscimos
desnecessários de carga.
É sempre importante na utilização de um equipamento de movimentação de
cargas que tomemos como base as indicações das tabelas de cargas do equipamento
para as diversas possibilidades de configuração, atentando para as limitações,
não só em relação à capacidade de carga, aos quadrantes de operação e
velocidade de vento admissível, como em relação ao número de pernas de cabo
requerido, não havendo dessa forma que se recorrer a nenhum artifício
adicional, ou tabela adicional que não esteja incorporada na literatura técnica
do equipamento fornecida pelo fabricante.
Autor: Roberto de Souza van der
Linden, Engenheiro Mecânico (UFPE), com curso de especialização em Engenharia
Naval (UPE/USP) e Rigger RGS/1459/2009
(OPUS/SOBRATEMA)
Linden Engenharia
robertolindenen@hotmail.com
robertolindenen@hotmail.com
Excelente artigo! Uma abordagem relevante principalmente quando se trabalha em operações onde o fator de utilização do equipamento já é uma condição crítica.
ResponderExcluirObrigado.
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